Tesouro Nacional alerta que baixa liquidez é principal responsável pela falta de capacidade de pagamento das cidades; situação do Rio, Goiânia, Campo Grande e Maceió é mais crítica
PAULA SALATI • SÃO PAULO
Publicado em 14/11/18 às 05:00
Das 26 capitais brasileiras, nove estão com nota C na capacidade de pagamento (Capag), o que significa que elas não podem contratar empréstimos que sejam garantidos pelo governo federal.
O cenário melhorou em relação a 2017, quando 12 cidades estavam inelegíveis para tomar crédito com aval da União. Os municípios que melhoraram as suas notas foram Aracaju (SE) (de C para B), Curitiba (PR) (C para B) e Palmas (C para A).
Contudo, especialistas ouvidos alertam que o número de capitais sem capacidade de pagamento pode aumentar, principalmente por conta do descontrole dos gastos com as aposentadorias dos servidores públicos.
A capacidade de pagamento dos estados e municípios é calculada a partir dos índices de endividamento, de poupança e da disponibilidade de caixa para honrar obrigações financeiras.
As nove capitais em situação crítica são Campo Grande (MS), Florianópolis (SC), Goiânia (GO), Maceió (AL), Natal (RN), Porto Alegre (RS), Recife (PE), Rio de Janeiro (RJ) e São Luís (MA).
O Tesouro detalha que a principal causa da falta de capacidade de pagamento é a baixa liquidez. Das nove cidades sem rating, oito possuem nota C neste quesito, que é medido pela relação das obrigações financeiras sobre a disponibilidade de caixa. Goiânia (1656,57%), Natal (1072,65%) e São Luís (548,2%) possuem os piores indicadores de liquidez.
O órgão federal avalia que as capitais podem reverter a nota C a partir de 2019, caso haja um aumento das receitas que seja capaz de cobrir as obrigações financeiras. Contudo, isso não vale para as cidades de Campo Grande, Goiânia, Maceió, e Rio de Janeiro. “[Para essas cidades] solucionar o problema de caixa não seria suficiente, pois o indicador de poupança corrente desses municípios também indica um elevado comprometimento das suas receitas com despesas correntes”, destaca o Tesouro.
De acordo com o professor da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getulio Vargas (Ebape-FGV), Istvan Kasznar, isso se deve, especialmente, aos elevados gastos de pessoal, com destaque para os encargos com os pagamentos das aposentadorias.
Por conta disso, Kasznar diz que o número de prefeituras com falta de capacidade pagamento pode se elevar. “Infelizmente, há uma perspectiva de aumento dos pedidos de renegociação de dívidas dos municípios à União, principalmente no que diz respeito às contas da previdência pública.”
Por isso, ele defende que uma reforma da Previdência Social só será bem sucedida se for estendida aos governos estaduais e municipais. “Os números do Tesouro mostram um cenário fiscal desastroso. É um desconforto financeiro extremo”, lamenta Kasznar.
Gasto com pessoal Estados
Segundo o Tesouro, oito capitais romperam o limite de gasto com o pessoal. Pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), as despesas com o funcionalismo não podem ultrapassar 60% da Receita Corrente Líquida (RCL). Isso ocorre, porém, no Rio (76,2%), João Pessoa (63%), Maceió (62,2%), Porto Velho (61,2%), Vitória (60,5%), Fortaleza (60,4%), Florianópolis (60,1%) e Cuiabá (60,1%).
O professor de economia da Fundação Instituto de Administração (FIA), Rodolfo Olivo, destaca que a queda de receitas agravou muito o quadro das prefeituras. “A retração da atividade econômica e o aumento da informalidade derrubaram muito a arrecadação do ISS [Imposto sobre os Serviços, principal tributo próprio dos municípios]”, argumenta Olivo, lembrando que a informalidade do trabalho atinge mais o setor de serviços do que a indústria, por exemplo.
Contudo, segundo ele, a recuperação da receita tributária por meio da retomada econômica ainda não será suficiente para reverter o quadro. Para Olivo, isso dependerá de reformas nas previdências municipais, corte de cargas comissionados e operações de privatização de ativos.
No âmbito estadual, 11 unidades da federação (UFs) estão impedidas de receber garantia da União para novos empréstimos. No ano passado, haviam 10 estados nesta situação. Enquanto o Maranhão e Rio Grande do Norte reduziram a nota de B para C, o Piauí melhorou de C para B.
Além desses, Bahia, Distrito Federal, Goiás, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Pernambuco, Santa Catarina, Sergipe, Tocantins também estão com nota C. O Rio de Janeiro e o Rio Grande do Sul, por sua vez, estão com nota D.
O Tesouro destacou ainda que o déficit orçamentário dos estados tem provocado atrasos de pagamentos junto a fornecedores e, em casos mais graves, dos salários dos servidores. No ano passado, o rombo chegou a R$ 20 bilhões.
Esses atrasos se transformam em “restos pagar”, despesas que são transferidas de um ano para outro. Entre os anos de 2016 e 2017, a inscrição líquida de restos a pagar dobrou, ao passar de R$ 16,9 bilhões para R$ 16,9 bilhões.
“Esta forma de financiamento alternativa tem uma contribuição para criação de despesas superiores à das operações de crédito e onera os credores”, destacou o relatório do Tesouro Nacional.