Fab Labs democratizam tecnologias avançadas
22/01/2016
Por: Revista W
É bem provável que você já tenha ouvido falar sobre as impressoras 3D e suas magníficas criações. Existem modelos que imprimem brinquedos, roupas, próteses e até comidas. O problema é que, para ter um aparelho desses em casa, você terá de desembolsar a bagatela de R$ 8 mil. Mas, caso isso esteja fora de sua realidade, não desanime. Hoje, existem laboratórios que oferecem essa e outras máquinas por um preço camarada. Chamados de Fab Labs (abreviação de “fabrication laboratory”), os espaços têm o objetivo de democratizar as tecnologias mais avançadas.
“Um Fab Lab deve permitir que qualquer um tenha acesso a seu espaço e possa fabricar coisas. Pode ser um designer, um arquiteto ou um engenheiro, mas pode ser também uma pessoa sem formação específica nenhuma, alguém que não sabe nada a respeito do assunto, mas teve uma ideia ou tem muita vontade de aprender coisas novas”, diz a fundadora do Fab Lab Floripa, Cláudia Bär.
O conceito nasceu em 2001, no Massachusetts Institute of Technology (MIT), nos Estados Unidos, durante o curso intitulado “How to make almost anything” (Como fazer quase qualquer coisa) ministrado pelo físico e professor Neil Gershenfeld. A ideia era que os alunos pudessem experimentar as máquinas de fabricação digital para inventar o que viesse a mente. As aulas fizeram muito sucesso e outras universidades resolveram ministrá-las também. Assim, criou-se uma rede internacional de Fab Labs.
Em Terras Brasileiras
Os laboratórios se expandiram para além das terras do Tio Sam e, hoje, contabilizam cerca de 500 espaços no mundo. Existem bases em vários países, como África do Sul, Espanha, Holanda, Japão, Peru, França e Austrália. Ao Brasil, eles só chegaram dez anos após sua criação. Quem trouxe o projeto foi Heloisa Neves, atual diretora executiva do Fab Lab Brasil Network. “Somos a associação que apoia e instrui os espaços em solo brasileiro, além de sermos referência para a rede internacional”, explica.
O primeiro Fab Lab nasceu em São Paulo dentro da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAUUSP). “O que mais chamou a atenção foi o fato de que, além de contar com um maquinário avançado, os alunos conseguiriam trocar experiências com pessoas de dentro e fora do País”, diz uma das professoras que coordenam o projeto, Tatiana Sakurai. “O FabLabSP é um espaço didático, de experimentação e pesquisa dentro da FAU e da própria Universidade. Nosso laboratório também trabalha aberto às demais unidades da USP e à comunidade, por meio de atividades de extensão que promovemos”, completa Paulo Eduardo Fonseca de Campos, professor e fundador do espaço.
Modelos e preços
Os Fab Labs podem ser baseados em três modelos. O profissional é o mais comum. Ele é criado por um empreendedor que se responsabiliza pelos gastos, ou seja, o laboratório depende de recursos privados para funcionar. A captação do dinheiro vai depender do que o fundador achar mais viável, pode ser desde um empréstimo a um banco até a poupança da mãe. De acordo com Heloisa, normalmente é preciso pagar para usá-los. Os preços são cobrados por hora e variam de R$ 30 até R$ 150, dependendo da máquina.
Já o acadêmico é vinculado a uma universidade e é ela quem arca com os gastos. “Dependendo da instituição, será necessário pagar para usar o Lab”, diz Heloisa. “As públicas não cobram nada, mas as privadas tendem a pedir um pequeno reembolso”. Além da FAUUSP, o SENAI do Rio de Janeiro também aposta na tendência. Com sede no bairro de Benfica, é o único no mundo dentro de uma escola técnica e o segundo maior em espaço do planeta (perde apenas para o do Japão).
“Além de contar com uma disciplina de 20 horas obrigatórias para todos os cursos aprenderem a mexer no maquinário e mais 140 opcionais para ganhar um diploma de Auxiliar de prototipagem maker, nosso Fab Lab é aberto para a comunidade e a um preço baixo, pois conseguimos subsidiar 80% do valor das máquinas”, afirma Sergio Poliano Villarreal, coordenador tecnológico do Centro de Tecnologia SENAI Automação e Simulação.
Por fim, existe o modelo público que é sustentado pelo governo ou por instituições públicas. Totalmente gratuito e aberto para qualquer pessoa, ainda não há um laboratório desse formato no Brasil. “Atualmente, o estado de São Paulo está com um projeto junto com a Fab Lab Brasil Network para abrir um espaço desse tipo no País”, conta Cláudia.
Direitos e deveres
Quem quiser montar um Fab Lab em sua cidade – independentemente do modelo – deve ter a consciência de que seu custo é bem alto, tanto inicial quanto para mantê-lo. Os gastos com componentes, máquinas e acessórios giram em torno de R$ 300 mil. Mas esse valor pode ficar ainda mais salgado. Por exemplo, o Fab Lab Barcelona, na Espanha, saiu na faixa de R$ 500 mil e o FabLab Groningen, nos Países Baixos, R$ 600 mil.
Vale ressaltar que todo laboratório que faz parte da Fab Lab Brasil Network e da Fab Foundation, associação internacional que monitora a rede, deve seguir uma carta de princípios. Uma das regras mais importantes é que todo espaço deve ceder um dia da semana para ser aberto à comunidade. O chamado Open Day tem de ser gratuito ou a preço acessível. Cursos sobre como mexer nas máquinas ou para quem já utiliza as ferramentas podem ser feitos nessa data.
Outro ponto é o maquinário básico requisitado. Os laboratórios são obrigados a fornecer cinco máquinas. São elas: impressora 3D, cortadora a laser, cortadora de vinil, fresadora de precisão e fresadora de grande formato. “Por isso, um mesmo projeto pode ser feito em São Paulo ou Barcelona”, exemplifica Heloisa. Os Fab Labs também podem disponibilizar outros aparelhos. Em Floripa, por exemplo, existe material próprio para atividades de marcenaria e tricô.
Se um dos espaços não cumprir os princípios descritos na carta, o caso é levado para um evento internacional organizado pela Fab Foundation.“Ali, decidimos se o Fab Lab ficará fora da lista de associados a partir daquele momento ou se daremos um tempo para que ele conserte os problemas”, afirma Heloisa.
O futuro
Mais do que oferecer tecnologias avançadas por um preço legal, quem trabalha em um laboratório de fabricação acredita que o futuro está no chamado Fab Lab 2.0. A ideia é cada vez mais instigar os usuários a criar suas próprias máquinas, para que elas passem a ser usadas pelo coletivo. Pode até parecer utópico, mas Campos garante que essa é
uma das metas do FabLabSP. “Há espaço para invenção de nosso próprio maquinário, tais como as impressoras 3D de concreto e outros equipamentos similares empregando tecnologia robótica”, afirma o professor e fundador do espaço.
Mais realista, o Fab Lab Floripa pretende arranjar formas de baratear seu espaço e, quem sabe, até torná-lo totalmente gratuito. “Isso pode ser uma dificuldade, pois precisamos pagar o custo das máquinas e toda a estrutura envolvida para disponibilizá-las”, diz Cláudia. “Porém, estamos estudando como podemos manter o negócio de pé, quitar nossas contas e, ainda assim, oferecer atividades ao mais baixo custo possível.”
Em relação a novos laboratórios, pelo menos por parte do SENAI do Rio de Janeiro essa tarefa está a todo vapor. “Nossa meta é implantar três novos espaços por ano no Brasil. Claro que apenas no Rio, já que a Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (FIRJAN) é responsável pela escola técnica”, diz Villarreal. Uma boa ideia seria que outras empresas privadas e públicas aderissem à ideia e espalhassem mais Fab Labs pelo País.