O projeto elaborado tem como objetivo o desenvolvimento de um sistema de ar condicionado e ventilação que atenda aos Laboratórios de Instrumentação e Túneis de Vento do Departamento de Engenharia Mecânica da Escola Politécnica da USP. Além do aspecto relativo ao conforto térmico dos usuários, fornece-se ao longo do estudo uma especial atenção à qualidade do ar interior dos ambientes climatizados e à economia no consumo de energia elétrica da instalação. O dimensionamento das capacidades de retirada de carga térmica dos equipamentos de condicionamento de ar é realizado considerando-se duas possíveis configurações de sistema, o que possibilita uma comparação entre o desempenho, em termos energéticos, de cada uma delas. A primeira configuração refere-se à utilização de equipamentos dedicados ao ar externo, enquanto a segunda é relativa ao formato mais tradicional de sistema, no qual o ar de retorno e o ar de renovação são unidos na caixa de mistura de um equipamento condicionador de ar. No desenvolvimento do projeto é efetuada também uma análise da viabilidade de utilização de um sistema do tipo ciclo-economizador nos laboratórios, o qual consiste na utilização do ar externo para retirar a carga térmica dos ambientes nos horários em que suas condições psicrométricas assim o permitam, sendo realizado para tal fim um estudo detalhado da variação da entalpia do ar na cidade de São Paulo ao longo do ano.
Introdução
A qualidade do ar interior em ambientes de instituições de ensino tem obtido maior destaque nos estudos relacionados ao assunto nos últimos anos. Pesquisadores destacados, como o Prof. Bjarne W. Olesen da Universidade Técnica da Dinamarca tem apresentado resultados interessantes para estudos de caso que relacionam o desempenho dos estudantes em função da Qualidade do Ar Interno (QAI) nestas escolas. Soluções para sistemas de tratamento de ar com o uso de energia de modo racional e otimizado e que proporcionem a Qualidade do Ambiente Interior devem ser a meta de bons projetos e instalações modernas.
A proposta do presente artigo é apresentar hipóteses, modelos e análise de soluções para dois ambientes de laboratório em que são realizadas atividades didáticas e de pesquisa localizado na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. São dois ambientes com ocupações diferentes, sendo um deles, identificado Laboratório de Instrumentação, tem atividades dedicadas à realização de processos de fabricação de protótipos, ensaios experimentais, com uso de processos de fabricação mecânica, com destaque para processos em que ocorre contaminação por desbaste e por soldagem. O segundo ambiente, denominado Laboratório de Túneis de Vento é utilizado para aulas experimentais para significativo grupo de alunos em bancadas experimentais de aerodinâmica, túneis de vento, como também em atividades computacionais e de fabricação de protótipos de aeronaves e suas partes.
O Laboratório de Túneis de Vento teve suas aberturas para o meio exterior, que permitiam a ventilação natural, totalmente fechadas, e tem, como consequência, a falta de renovação de ar e degeneração da QAI. O Laboratório de Instrumentação não possui exaustão localizada ou outro tipo de exaustão mecânica que possa realizar a retirada de contaminantes produzidos em processos.
Com objetivo de melhorar a qualidade do ar interno foi feito estudo de alternativas para sistemas de tratamento de ar que possam ser energeticamente eficientes, considerando as cargas térmicas locais e as condições climáticas típicas da cidade de São Paulo.
O dimensionamento das capacidades de retirada de carga térmica dos equipamentos de condicionamento de ar é realizado considerando-se duas possíveis configurações de sistema, o que possibilita uma comparação entre o desempenho, em termos energéticos, de cada uma delas. A primeira configuração refere-se à utilização de equipamentos dedicados ao ar externo, enquanto a segunda é relativa ao formato mais tradicional de sistema, no qual as vazões do ar de retorno e do ar de renovação são somadas na caixa de mistura de um equipamento condicionador de ar. É feita a análise do consumo de energia elétrica de diferentes alternativas para os equipamentos em busca de um menor valor de consumo energético. No desenvolvimento do projeto foi efetuada também uma análise da viabilidade de utilização de um sistema do tipo ciclo economizador nos laboratórios, o qual consiste na utilização do ar externo para retirar a carga térmica dos ambientes nos horários em que suas condições psicrométricas assim o permitam, sendo realizado para tal fim um estudo detalhado da variação da entalpia do ar na cidade de São Paulo ao longo do ano. Essa análise demonstrou que o emprego de um sistema ciclo economizador no projeto é viável. A inserção do mesmo no sistema provoca um acréscimo nos custos iniciais da instalação, devido à maior quantidade de material empregado nos dutos de ar e à necessidade de utilização de ventiladores de maior capacidade de vazão para as tomadas de ar externo. No entanto, apesar do acréscimo inicial nos custos, obteve-se uma grande economia no consumo energético das salas com o uso do ciclo economizador, podendo alcançar de 20% e 30% do total de energia consumida, respectivamente, nos ambientes do Laboratório de Instrumentação e no de Túneis de Vento. Esta proposta também colabora para a melhor QAI, com ampliação das vazões de ar para renovação.
Por fim, o resultado da viabilização do sistema de tratamento de ar nestes laboratórios também tem como objetivo proporcionar uma instalação que permita a realização de estudos posteriores considerando a sua operação em diferentes condições de vazão e filtragem de ar e estabelecer correlações com a qualidade do ar interior e o consumo de energia.
Descrição da edificação
O primeiro passo no sentido de realizar o dimensionamento do sistema de condicionamento de ar para os laboratórios consiste na definição das características construtivas da edificação na qual os mesmos estão localizados. Nesse sentido, as quantidades utilizadas de cada material, bem como o cálculo dos coeficientes globais de transmissão de calor de paredes, teto e janelas da edificação estão disponíveis na Tabela (1), sendo importante ressaltar que duas espessuras diferentes de paredes estão presentes na construção.
Um dos fatores essenciais para o cálculo da quantidade de calor que entra nos ambientes é a definição do perfil de temperaturas externas da região onde está localizada a edificação estudada, no caso a região da Cidade Universitária em São Paulo. O valor para a temperatura exterior máxima considerado no projeto é igual àquele para o qual em apenas 1% das horas do ano a temperatura de bulbo seco é superior, de 31,0 °C, de acordo com a Tabela (2), relativa aos dados climáticos normalizados para a região do Aeroporto de Congonhas em São Paulo, disponível no Anexo A da norma NBR 16401 (ABNT, 2008).
Com a temperatura máxima determinada, obtém-se, de acordo com o método de cálculo sugerido em ABNT (2008), o perfil de temperaturas externas ao longo do dia, disponível no Gráfico (1).
O layout dos laboratórios e ambientes contíguos está disponível na Figura (1), na qual podemos encontrar ainda a orientação geográfica e a localização das janelas, informações importantes para o cálculo da carga térmica incidente nos ambientes estudados.
Cálculo de carga térmica
O cálculo da carga térmica total incidente nos laboratórios, a qual deverá ser removida pelo sistema de climatização, leva em consideração as diversas fontes de calor existentes nos ambientes assim como a transmissão de calor através de paredes, tetos e vidros. O valor de temperatura interna de projeto adotado para os laboratórios e utilizado nos cálculos é de 24°C, enquanto o perfil de temperaturas externas empregado é aquele já demonstrado.
Os equipamentos presentes nos laboratórios, os quais correspondem a uma fonte interna importante de calor nos ambientes, estão disponíveis na Tabela (3). Para o Laboratório de Instrumentação, adotou-se a hipótese da existência de um fator de simultaneidade (FD) de 0,46 sobre a soma das cargas térmicas máximas para computadores e monitores, fator que leva em consideração o tempo durante o qual alguns deles permanecem desligados ou entram no modo de economia de energia (LEVY, 2000). No Laboratório de Túneis de Vento esse fator não é empregado, uma vez que todos os equipamentos são utilizados durante as aulas de Mecânica dos Fluidos. Além disso, considerou-se que a furadeira e o esmeril não sejam utilizados simultaneamente e desprezou-se a existência de um forno de micro-ondas, admitindo a hipótese de que o mesmo funcione apenas ocasionalmente.
A taxa de ocupação das salas foi definida como sendo de 6 pessoas no Laboratório de Instrumentação e de 36 pessoas no Laboratório de Túneis de Vento, no qual são ministradas aulas de Mecânica dos Fluidos. No Gráfico (2) são apresentados os valores das parcelas componentes da carga térmica nos laboratórios.
Os valores de carga térmica total, sensível e latente calculados para os laboratórios estão disponíveis na Tabela (4). O Laboratório de Instrumentação, por possuir uma de suas paredes em contato com o ambiente externo, apresenta variação da carga ao longo do dia, estando o perfil dessa variação disposto no Gráfico (3). Já no Laboratório de Túneis de Vento, devido ao fato de não possuir paredes externas, a carga térmica mantém-se constante ao longo do dia.
O presente artigo continua na próxima edição e fez parte dos trabalhos premiados no XIV Conbrava - Congresso Brasileiro de Refrigeração, Ar Condicionado, Ventilação e Tratamento do Ar.
Renovação de ar
Os valores de renovação de ar nos ambientes condicionados foram determinados utilizando-se o método proposto pela norma NBR 16401 (ABNT, 2008), tendo sido utilizado no projeto o nível 2, intermediário, de renovação fornecido para laboratórios de ciências, conforme disposto na Tabela (5). Na Tabela (6), encontram-se os valores de vazão de renovação de ar calculados para os laboratórios. Cabe ressaltar que os valores de vazão obtidos são maiores que 27 / (h*pessoa), valor mínimo de renovação determinado para ambientes onde não há grande fluxo de pessoas, de acordo com ANVISA (2003).
Tabela 5 - Níveis de renovação de ar fornecidos pela NBR 16401 para laboratório de ciências
Tabela 6 - Vazão volumétrica de renovação nos laboratórios
Ventilação local exaustora
No Laboratório de Instrumentação (MT 16), temos a presença de um equipamento de solda elétrica, o que exige o dimensionamento de um sistema de ventilação local de exaustão para retirar adequadamente os fumos gerados pela soldagem e evitar, dessa forma, que os mesmos se dissipem pelo ambiente. A vazão de exaustão necessária para efetuar essa retirada de contaminantes varia de acordo com o tipo de coifa utilizada e da sua distância em relação ao ponto de geração dos contaminantes.
No projeto, optou-se pela utilização de uma coifa cônica do tipo “bico de pato”, posicionada sobre a mesa de soldagem, sendo a vazão de exaustão requerida determinada a partir da Equação (1):
Q=(10*x²+A)*Vc (1)
Na qual x é a distância da coifa ao ponto de geração dos fumos da solda, A é a área da seção transversal da coifa e é a velocidade de captação dos contaminantes, medida em seu ponto de geração, para a qual recomenda-se a utilização de valores entre 30 e 60 m/min para o caso de solda elétrica (MACINTYRE, 1990).
O valor de vazão encontrado para a exaustão local, caso seja maior que o valor de vazão de renovação obtido na seção anterior, será o valor utilizado para determinar a vazão de ar externo no ambiente. As características dimensionais da coifa utilizada, a velocidade de captação empregada e a vazão de exaustão local obtida estão disponíveis na Tabela (7), tendo esse valor de vazão volumétrica já sido corrigido para as condições psicrométricas de projeto do ar interior do laboratório:
Tabela 7 - Vazão local de exaustão no Laboratório de Instrumentação (MT 16)
Carga térmica do ar externo
Os valores das propriedades psicrométricas do ar externo, do ar de insuflação e do ar no interior dos ambientes condicionados estão disponíveis na Tabela (8), sendo considerada a manutenção do ar interior nos laboratórios à temperatura interna de projeto de 24°C e 50% de umidade relativa e a utilização de ar de insuflação à temperatura de bulbo seco de 14°C e 95% de umidade relativa.
Tabela 8 -Propriedades psicrométricas dos ares de renovação, de insuflação e interior
O cálculo da carga térmica do ar externo é realizado considerando-se a necessidade de levá-lo às condições psicrométricas do ar interior, sendo o cálculo dessa carga realizado de acordo com a Equação (2), lembrando que a obtenção da vazão volumétrica de ar de renovação foi realizada de acordo com o método proposto pela NBR 16401, o qual é baseado na densidade padrão do ar de p=1,204 kg/m^3.
A carga térmica total que deve ser retirada dos ambientes pelo ar de insuflação pode ser obtida através da soma da carga térmica do ar externo com a carga térmica ambiente, estando os valores de suas componentes sensível e latente disponíveis no Gráfico (4). As vazões volumétricas de ar obtidas em função dos valores de renovação, de carga térmica e das condições psicrométricas do ar no sistema para essa configuração de sistema estão disponíveis na Tabela (9).
Gráfico 4 - Componentes sensível e latente das cargas térmicas nos laboratórios
Tabela 9 - Vazões de ar no sistema
Seleção de equipamentos
A seleção dos equipamentos foi realizada considerando-se duas configurações possíveis de sistema, representadas na Figura (2). A primeira configuração estudada é aquela na qual o ar externo é tratado por um equipamento dedicado e lançado diretamente no ambiente, enquanto a segunda refere-se ao formato tradicional de sistema no qual o ar de renovação é misturado com o ar de retorno num mesmo equipamento condicionador de ar.
Figura 2 - Configurações de Sistema:(1) Ar externo tratado separadamente (2) Ar externo e de retorno misturados
Em relação à primeira configuração de sistema analisou-se, ainda, a viabilidade de dois casos diferentes, o caso A1, no qual o ar externo é levado, pelo equipamento dedicado, às condições do ar interior de projeto, e o caso A2, no qual maior quantidade de calor é retirada pelo equipamento dedicado, sendo o ar externo levado às condições psicrométricas definidas para o ar de insuflação.
A partir de catálogos de fabricantes, foram selecionados os equipamentos condicionadores de ar que mais se adequassem a cada configuração de sistema e a cada caso estudado. Essa seleção foi realizada, ainda, considerando a utilização tanto de equipamentos de expansão direta quanto de equipamentos à água gelada, sendo nesse caso acoplados ou um chiller único no sistema ou chillers individuais para cada laboratório. Na Tabela (10) está presente a comparação da potência total instalada dos equipamentos selecionados para cada configuração de sistema analisada.
Tabela 10 - Comparação da potência consumida nas diferentes configurações de sistema
Verifica-se, portanto, que a alternativa de sistema que apresenta o menor valor de consumo energético é a Configuração B, na qual o ar externo e de retorno são misturados em equipamentos de expansão direta. Tendo em vista os valores de carga térmica e de vazão de ar envolvidos no sistema, a opção de equipamentos que mostrou melhor desempenho dentro dessa configuração foi a seleção de um equipamento self contained para cada laboratório. As informações das máquinas selecionadas estão disponíveis na Tabela (11).
Tabela 11 - Equipamentos condicionadores de ar selecionados
Análise do sistema ciclo-economizador
O princípio de funcionamento do sistema ciclo-economizador estudado consiste na verificação da possibilidade de utilização somente do ar de renovação para retirar a carga térmica interna das salas durante os períodos do dia em que as condições psicrométricas do ar externo assim o permitam. Para tal, deve ser instalado um novo sistema de tomada de ar externo, dotado de ventilador e filtros, que funcione em paralelo com as máquinas de condicionamento do ar selecionadas para cada laboratório. Tal sistema terá a função de fornecer o ar externo para os dutos de insuflação, com vazão suficiente para cobrir a carga térmica interna, vazão essa calculada a cada hora de acordo com as variações das condições psicrométricas do ar de renovação ao longo do dia. Quando em funcionamento, esse sistema permite o desligamento dos circuitos de refrigeração dos equipamentos de condicionamento de ar, viabilizando uma economia no consumo de energia elétrica, na medida em que a potência demandada pelo ventilador em paralelo é pequena quando comparada às potências consumidas pelos equipamentos self contained utilizados.
Ao longo do cálculo da economia de consumo elétrico proporcionado pela adoção do ciclo-economizador foram adotadas algumas hipóteses simplificadoras. A primeira delas está relacionada à definição das condições psicrométricas adotadas para o ar exterior ao longo do ano, a qual será realizada considerando-se as condições de um dia típico definido no projeto para cada mês. A temperatura máxima adotada para os dias típicos de cada mês é aquela na qual em apenas 1% das horas do mês a temperatura de bulbo seco do ar externo é superior. Em relação à umidade relativa do ar externo, será considerado como hipótese que a mesma se mantenha constante ao longo do dia, tendo os valores de umidade sido calculados a partir das condições psicrométricas do ar na temperatura máxima de cada dia típico.
Uma hipótese adotada no cálculo da potência elétrica consumida pelo sistema é a de que, nas horas em que os equipamentos self contained empregados para o condicionamento de ar nos laboratórios estejam em funcionamento, a potência consumida pelos seus respectivos sistemas de refrigeração seja igual àquela disposta na Tabela (10). Por outro lado, nas horas em que os equipamentos de condicionamento de ar não estejam em funcionamento, ou seja, em que a demanda de carga térmica do ambiente esteja sendo suprida apenas pela insuflação de ar externo, será considerado que o consumo do sistema se resuma à potência elétrica consumida pelos ventiladores, aos quais serão acoplados inversores de frequência para controle de rotação, de forma que os mesmos possam fornecer, em cada hora do dia típico considerado, a vazão de ar externo no nível correto para retirar a carga térmica interna dos laboratórios.
Como hipótese simplificadora, será considerado na análise de consumo do sistema que o rendimento do ventilador não varie de forma relevante em função da vazão fornecida. A adoção dessa hipótese pode ser executada devido ao fato da potência consumida pelos equipamentos self contained, quando os mesmos estão em funcionamento, ser muito maior do que a potência consumida pelo uso somente dos ventiladores, o que faz com que a distorção provocada pelos cálculos realizados com rendimentos constantes seja desprezível frente ao consumo total do sistema ao longo de um dia típico estudado.
Dessa forma, definidas as hipóteses simplificadoras empregadas na análise do sistema ciclo economizador, a variação de entalpia do ar externo ao longo do ano obtida para a cidade de São Paulo pode ser visualizada no Gráfico (5), sendo o valor da entalpia do ar interior de projeto igual a 50 kJ/kg.
Gráfico 5 - Entalpia do ar externo ao longo dos dias típicos de cada mês
Horários passíveis de uso exclusivo de ar externo
Nos horários em que a entalpia do ar de renovação é inferior à do ar interior de projeto, a vazão volumétrica a ser insuflada de ar externo para retirar a carga térmica total do ambiente pode ser calculada através da Equação (3):
A partir da equação, visualiza-se que, para pequenas diferenças de entalpia entre o ar interior de projeto e o ar externo, a vazão de ar de renovação necessária para realizar o condicionamento do ar dos ambientes torna-se muito grande. Dessa forma, verifica-se a necessidade de se estabelecer um limite superior para a vazão de ar externo que pode ser fornecida ao sistema, limite esse determinado pela potência do ventilador a ser instalado na tomada de ar externo e pela capacidade de insuflação dos difusores utilizados para cada laboratório.
A comparação do número de horas no ano em que é possível o uso somente de ar de renovação para retirar a carga térmica do ambiente, em função do limite superior determinado para a vazão de ar externo em cada laboratório, pode ser realizada a partir do Gráfico 5. Para a obtenção do número de horas anuais, considerou-se que as salas sejam utilizadas durante 20 dias por mês, sendo as condições do ar externo em cada dia consideradas semelhantes àquelas dos dias típicos obtidos anteriormente para cada mês. Além disso, devem ser considerados nessa análise apenas os períodos compreendidos dentro dos horários de ocupação das salas, ou seja, das 08h00 às 20h00 para o laboratório de instrumentação e das 06 horas às 24h00 horas para o laboratório de túneis de vento.
Conforme era esperado, pode-se verificar no Gráfico 6 que, conforme é aumentado o limite superior da vazão de ar externo que pode ser fornecida ao sistema, o número de horas em que é possível realizar o condicionamento do ar nas salas somente utilizando-se o ar de renovação também aumenta. Tal fato implica, portanto, em acréscimo no número de horas em que os equipamentos self contained de cada laboratório podem ficar desligados, gerando assim uma maior economia de energia, tendo em vista que a potência consumida pelo uso somente do ventilador relativo ao ar externo é pequena quando comparada à potência demandada pelo circuito de refrigeração dos equipamentos condicionadores de ar.
Gráfico 6 - Número de horas passíveis de utilização exclusiva de ar externo em função da vazão limite
Comparação do consumo anual
Obtido o número de horas anuais em que a demanda de carga térmica das salas pode ser suprida pela insuflação exclusiva de ar de renovação, pode-se calcular o consumo anual de energia elétrica do sistema de condicionamento de ar, em função da vazão limite de ar externo e dos dados das potências nominais dos componentes do sistema de refrigeração dos equipamentos self contained.
A comparação do consumo elétrico anual do sistema, em função da vazão limite de ar externo possível de ser insuflada, pode ser realizada a partir do Gráfico 7, no qual estão disponíveis também, a título de comparação, os valores de consumo anual dos equipamentos para o caso em que não se utilize o sistema ciclo economizador, chamados de dados base de acordo com a nomenclatura adotada no gráfico.
Gráfico 7 - Consumo anual do sistema em função da vazão limite de ar externo
Visualiza-se, portanto, conforme era esperado, que o consumo de energia elétrica do sistema diminui com o aumento da vazão limite de ar externo, em movimento proporcional ao número de horas, dentro do período de ocupação das salas, em que os equipamentos de condicionamento de ar podem permanecer desligados. Para a vazão de ar externo mínima adotada no gráfico, de 6000 metros cúbicos por hora, a economia de energia elétrica, quando realizada a comparação com o sistema sem uso de ciclo economizador, já é significativa, sendo seu valor ao redor de 3 MW.h para o laboratório de instrumentação e 7 MW.h para o laboratório de túneis de vento. Essa economia aumenta progressivamente com o acréscimo na vazão limite de ar externo, até atingir valores próximos de 5 MW.h e 14 MW.h, respectivamente, para cada um dos laboratórios. Pode-se visualizar, portanto, que o laboratório de túneis de vento é aquele no qual o aumento da economia de energia com o aumento da vazão limite é mais significativa.
A faixa de vazão de ar externo passível de ser insuflada em cada laboratório foi calculada no projeto a partir dos dados de capacidade de insuflação dos difusores. Esses difusores são do tipo de alta indução, já tendo sido projetados para aplicações em sistemas de volume de ar variável. A faixa de vazão de ar permissível, o número de horas no ano passíveis de utilização exclusiva de ar externo para retirar a carga térmica do ambiente e a economia de energia elétrica proporcionada pelo emprego do sistema ciclo-economizador no projeto estão disponíveis na Tabela (12).
Verifica-se, dessa forma, que a utilização do sistema ciclo-economizador proporciona uma economia de energia considerável no projeto, ao redor de 20% e 30% do consumo original dos laboratórios de Instrumentação e de Túneis de Vento, respectivamente. As configurações das redes de dutos de ar presentes nas salas, de insuflação, tomada de ar, retorno e exaustão, foram desenvolvidas utilizando-se as vazões de ar referentes ao sistema com ciclo economizador, as quais, conforme pode ser visualizado na Tabela (12) são superiores às vazões originais disponíveis na Tabela (9). O dimensionamento dessas redes, bem como seus desenhos detalhados e o cálculo das perdas de carga distribuídas e singulares envolvidas nas mesmas encontram-se disponíveis no relatório integral do projeto, não tendo sido inseridos no presente artigo devido à sua extensão.
Tabela 12 - Equipamentos condicionadores de ar selecionados
Considerações finais
O projeto elaborado consiste no desenvolvimento de um sistema de ar condicionado e ventilação voltado aos laboratórios de Instrumentação e de Túneis de Vento do Departamento de Engenharia Mecânica da Escola Politécnica da USP. Ao longo do projeto, foi fornecida especial atenção, além do conforto térmico dos usuários, à qualidade do ar interior nos ambientes e ao consumo energético do sistema projetado. Para a obtenção de uma boa qualidade do ar, especialmente em relação ao Laboratório de Instrumentação, a utilização de equipamentos de solda exigiu o desenvolvimento de um sistema de exaustão localizada para a correta retirada dos contaminantes produzidos.
O dimensionamento das capacidades de retirada de carga sensível e latente requisitadas para as máquinas de condicionamento de ar foi realizado tendo em vista duas possíveis configurações de sistema. A primeira refere-se àquela na qual o ar externo é tratado por um equipamento dedicado e jogado diretamente no ambiente e a segunda configuração está relacionada àquela na qual o ar de renovação é misturado com o ar de retorno na caixa de mistura de um equipamento de HVAC (Aquecimento, Ventilação e Ar Condicionado).
A partir dos valores de capacidade demandada, foram selecionados equipamentos que se adequassem à utilização em cada uma das configurações de sistema estudadas. Realizada a comparação da potência total consumida pelos equipamentos em cada caso, verificou-se, então, que a configuração de sistema que, além de atender às demandas de carga térmica e de renovação de ar do projeto, minimizava o consumo elétrico da instalação era a Configuração B, na qual o ar externo e o de retorno são unidos em equipamentos condicionadores de ar do tipo self contained, tendo sido selecionados dois equipamentos, um para cada laboratório.
Outro estudo realizado consistiu na análise da viabilidade da instalação de um sistema ciclo-economizador no projeto. Esse sistema consiste na utilização do ar externo para retirar a carga térmica interna das salas nas horas em que sua entalpia seja inferior à do ar interior de projeto. Permite-se assim que os sistemas de refrigeração das máquinas possam ser desligados nesses horários, diminuindo, por sua vez, o consumo energético da instalação, na medida em que o consumo do uso somente de ventiladores é pequeno quando comparado ao consumo dos equipamentos de condicionamento de ar.
A realização dessa análise demonstrou que o uso do sistema ciclo-economizador permite uma redução considerável no consumo de energia elétrica anual do sistema, sendo que essa redução é cada vez mais significativa de acordo com o limite superior de vazão de ar externo considerado. A determinação da vazão máxima permissível para cada laboratório foi realizada em função da capacidade de insuflação dos difusores selecionados. O valor de vazão máxima, dessa forma, foi fixado em 8640 e 10800 para os laboratórios de Instrumentação e de Túneis de Vento, sendo obtida uma economia de 4,0 e 12,3 no consumo elétrico anual dos laboratórios com a implantação do sistema ciclo-economizador. O dimensionamento e a determinação das perdas de carga nos dutos de ar presentes no laboratório foram realizados levando-se em consideração os valores de vazão máxima admissível apresentados anteriormente. Em relação à quantidade de material empregada nos dutos, verificou-se que a área de chapas necessária é ao redor de 25% (vinte e cinco por cento) maior quando da utilização do sistema ciclo economizador, devido às maiores vazões de ar incutidas no sistema. O aumento no custo inicial dos dutos de ar ocasionado por essa diferença, contudo, é desprezível frente à economia de energia elétrica proporcionada pelo emprego do ciclo economizador. Os filtros de ar selecionados para utilização nas tomadas de ar externo dos laboratórios pertencem à classe F7, de forma que suas capacidades de filtragem são superiores à exigida pela norma NBR 16401 (ABNT, 2008) para esse tipo de aplicação. Os ventiladores das tomadas de ar e do sistema de exaustão localizada foram selecionados de acordo com as perdas de carga obtidas no dimensionamento do sistema de dutos, sendo que os ventiladores relativos às tomadas de ar externo devem ser dotados de inversores de frequência, de forma a viabilizar a variação de sua rotação e atender adequadamente às variações na demanda de vazão proporcionada pelo sistema ciclo economizador.
A configuração final de sistema adotada no projeto utiliza, portanto, equipamentos self contained para realizar o condicionamento do ar nos laboratórios, os quais operam em paralelo a um sistema ciclo economizador, viabilizando a utilização do ar externo para realizar a climatização das salas nos momentos em que suas condições psicrométricas são adequadas para tal fim. Além disso, devido aos diferentes horários de ocupação das salas, optou-se, ao longo do projeto, pela utilização de sistemas totalmente independentes para cada laboratório. Dessa forma, com o sistema assim projetado, foi possível alcançar-se o objetivo inicial do trabalho, de desenvolver um sistema de ar condicionado e ventilação que, além de promover o conforto térmico dos usuários, seja capaz de garantir um bom nível de qualidade do ar interior nos ambientes e minimizar o consumo de energia elétrica da instalação.
O presente fez parte dos trabalhos premiados no XIV Conbrava - Congresso Brasileiro de Refrigeração, Ar Condicionado, Ventilação e Tratamento do Ar.
André Fransolin Rollo - andrerollo90@gmail.com
Antonio Luís de Campos Mariani - camposmariani@gmail.com
Departamento de Engenharia Mecânica - Escola Politécnica da Universidade de São Paulo
Referências bibliográficas
ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas. “NBR 16401: Instalações de Ar-Condicionado – Sistemas Centrais e Unitários”. Rio de Janeiro, 2008.
ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução – RE nº9, de 16 de janeiro de 2003. “Orientação Técnica Elaborada por Grupo Técnico Assessor sobre Padrões Referenciais de Qualidade do Ar Interior em Ambientes Climatizados Artificialmente de Uso Público e Coletivo”. Brasília, 2003.
BOLLIGER JR, R.; MARIANI, A.L.C. “Sistemas de Ar condicionado e Ventilação”. Apostila do curso “Ar Condicionado e Ventilação”. EPUSP, São Paulo, 2006.
LEVY, S. J. “Dissipação de Calor de Equipamentos de Escritório”. Revista Abrava nº 177. São Paulo, setembro de 2008.
MACINTYRE, A. J. “Ventilação Industrial e Controle da Poluição”. 2ª ed. Editora Guanabara Koogan S.A., Rio de Janeiro, 1990.